sexta-feira, 17 de abril de 2009

O Soldado Ubaldo no Casamento de Arinéia

Bem no inicio dos 70 tinha um cabra da Igrejinha que apreciava ganhar uns trocos como "promotor de eventos" o que naquela época equivalia a nada mais nada menos que promover um arrasta-pé e faturar na entrada e na venda de cachaça, pois, cerveja gelada era coisa cara já que geladeira não tinha em todo canto.

O delegado de polícia era o Tenente João Gomes, da estirpe dos Jurubeba de Nazaré, atual Carqueja, entre Serra Talhada e Floresta. Só essa referência basta para indicar o "modus operandi" do doutor delegado, bem diferente dos superdelegados pimpões, proibidores de chibatas e tabaqueiros que tem aparecido hoje em dia.

Sabedor do terreno em que estava pisando, o já citado "promotor de eventos" compareceu à Delegacia de Policia onde foi atendido por Coligado, escrivão de oficio e tocador de tuba da Banda Pe. Carlos Cottart, onde soprava as mágoas de uma desilusão amorosa sem remédio.

O promotor de eventos se apresentou como pai de uma donzela chamada Arinéia e queria uma licença oficial para promover o forró comemorativo do enlace matrimonial da suposta noiva. Não era sempre que o tenente estava na delegacia e Coligado, mediante pequena taxa, equivalente a um quartinho de branquinha no bar do Coreto, concedeu o documento.

Ocorre que tudo isso era apenas artimanha do forrozeiro pois se assim não fosse, essa Arinéia casou tantas vezes quanto Fátima Costa completou 18 anos, eu mesmo estive em pelo menos 4 desses aniversários regados a Fanta laranja e licor de abacaxi.
Toda semana, mediante a taxinha, Coligado expedia uma licença e Arinéia comemorava o casamento num forró de lascar a tampa da chaleira.

Todo fim de semana tinha "casamento de Arinéia" animado pelo sanfoneiro Zé de Neco, com Nego Ciço do São Braz no pandeiro e o zabumbeiro Zé Gojoba, mas o Gojoba original, não esse falsificado que anda por ai.

Acontece que forró vira forró-bó-dó com a maior facilidade do mundo e num desses dias, no mais animado da festa, estourou uma confusão com um caboclinho do Borges, filho de uma senhora chamada Maria Muniz, que tinha tarimba no açougue municipal onde vendia carne de porco e embutidos suínos como lingüiça e chouriço de artesanal fabricação familiar, ou seja, o filhinho dela sabia bem manejar uma peixeira.

Mesmo estando em desvantagem, pois estava só, o caboclo enfrentou a confusão, e já tinha riscado a barriga de 2 ou 3 quando chegou a lei e a ordem personificadas no soldado Ubaldo de Zé de Borges.

Quem conheceu o soldado Ubaldo naquela época, e eu conheci, pois fomos colegas de escola, eu iniciando o ginásio e ele concluindo, sabe que Ubaldo mesmo com farda e armamento completo mais matulão e munição para 15 dias não passava de 50 quilos, tinha assim um porte de Marco Maciel depois da dengue, mas era querido e respeitado por todos, inclusive pelo encrenqueiro filho de Maria Muniz, que imediatamente parou o risca-faca e entregou a lambedeira de 10 polegadas a Ubaldo, que a pediu com aquela mansidão que lhe era característica:

Disse Ubaldo - Menino, esteja preso, me dê essa faca!.
Ao verem o oponente desarmado, a cabroeira frouxa e covarde partiu para cima do rapaz para o revide ou até para um linchamento o que Ubaldo, o guardião da ordem e da integridade do preso, repeliu prontamente:

Disse Ubaldo - Menino esteja solto, tome sua faca!
A cabroeira toda, ao ver o caboclinho de lambedeira na mão de novo recuou apavorada, e Ubaldo, calmamente, sem ter sequer tocado no seu revólver, com a mão no ombro do "menino" e este de faca empunhada, foram embora para o Borges, onde Ubaldo deixou o "preso" em casa e devolveu a faca ao ferramental de Maria Muniz.

Na segunda feira, ao saber do acontecido, o tenente João Gomes mandou chamar o forrozeiro e depois da conversa Arinéia nunca mais "se casou", mas Fátima Costa completou 18 anos mais algumas vezes, mas isso é outra estória...

Enviado Por Gilberto Moura

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